O Conselho Nacional de Trânsito (Contran) publicou na sexta-feira (27), resolução regulamentando a aplicação de multas a ciclistas e pedestres que desrespeitarem as leis de trânsito em todo o País. As multas já eram previstas no Código de Trânsito Brasileiro (CTB), de 1998, mas nunca haviam sido normatizadas. Quando as regras estiverem em vigor – dentro de 180 dias -, quem atravessar fora da faixa e for autuado terá de desembolsar R$ 44,19, metade do valor de uma multa leve aplicada a motoristas de carro.
A resolução prevê que cada autoridade de trânsito do País (municípios ou Estados, no caso das rodovias, ou mesmo a Polícia Rodoviária Federal) deverá elaborar seu próprio modelo de autuação. Também será solicitado o endereço do infrator, mas a informação não será obrigatória para a anotação da infração. Na capital paulista, o serviço ficará a cargo da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), que não respondeu aos questionamentos feitos na sexta pelo jornal O Estado de S. Paulo sobre o tema.
O texto federal prevê que o pedestre ou ciclista autuado terá de ser identificado, com o preenchimento obrigatório do nome e dos dados de um documento, além da identificação do agente responsável por aplicar a multa. No caso dos ciclistas, além da multa de R$ 130,16, há previsão de anotação de dados da bike e do número de identificação, “sempre que possível”, segundo a resolução. O texto não esclarece como será feita a cobrança da infração – algo que também ficará a cargo das autoridades locais de trânsito.
Fazem parte das infrações passíveis de punição atravessar fora de passarelas, transitar em túneis e viadutos (salvo em locais onde há permissão para o trânsito de pedestres). Já os ciclistas serão autuados se conduzir “onde não seja permitida a circulação” ou guiar “de forma agressiva”, segundo nota do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran).
Reações
A edição da norma divide a opinião de pedestres e ciclistas. Para alguns, a punição pode contribuir para mais segurança no trânsito. Outros, porém, acreditam que o cumprimento da legislação depende também de melhor sinalização e uma organização no trânsito menos voltada para os carros.
Carteiro há 27 anos, Julio Cesar Xavier, de 46 anos, percorre a pé diariamente as ruas de Perdizes, na zona oeste, por causa do trabalho e diz acreditar que a multa pode ajudar as pessoas a tomarem mais cuidado. “Acho uma medida correta, os pedestres não respeitam faixa de pedestre ou sinalização. Mas quem organiza o trânsito também precisa pensar mais em quem anda a pé. Os faróis, por exemplo, ficam verdes para o pedestre por pouco tempo.”
Na sexta, a reportagem flagrou, em 25 minutos, 12 pessoas atravessando a Avenida Sumaré, em frente ao Estádio Allianz Parque, fora da faixa. A empregada doméstica Maria José Alves, de 62 anos, foi uma delas. Ela diz tomar cuidado para atravessar a avenida e ser contra a punição. “Não tem que ter multa, não. Eu tomo cuidado, sei quando o farol fecha e cruzo a rua.”
A estudante Gabriela Marinho, de 19 anos, usa a bicicleta para ir à faculdade e diz aprovar a punição, mas tem dúvidas sobre o funcionamento da medida. Para ela, é preciso que seja mais claro o que significa guiar uma bicicleta de forma agressiva e como será a abordagem dos infratores. “Acho que as regras têm de ser para todos. Mas tudo tem de estar bem definido para não haver abuso de nenhum dos lados, caso contrário a punição sempre recai sobre o mais fraco. Em São Paulo, os motoristas já acham que o ciclista sempre está errado porque pensam que a rua é só para carros.”
Para o doutorando em Mobilidade pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU/USP) e consultor de mobilidade Mauro Calliari, autor do blog Caminhadas Urbanas, do Estado, a regulamentação era necessária, uma vez que estava prevista no CTB. “Mas há algumas questões”, ressalva. “Neste momento, em que há aumento de mortes de pedestres e ciclistas, e uma infraestrutura que privilegia o viário, com poucas opções para andar a pé é possível aplicar uma lei dessas. Muitas calçadas obrigam o pedestre a andar na rua”, diz. “Outra coisa é que não houve nenhuma discussão com as entidades nem de pedestres nem de ciclistas.” “É claro que há situações em que pessoas se expõem a riscos, mas a media pode gerar uma culpabilidade em quem é mais frágil”, conclui.
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